13.1.07

Resposta da Mônica ao Desafio XVIII


Vejam, senhoras e senhores, respeitável público, isso não é engraçado. Não mesmo. Chamá-los de respeitáveis é até uma ironia, eu diria. Posso ver nos olhos de alguns de vocês que escondem segredos capazes de arrepiar os cabelos de um velho palhaço careca como eu...É eu sei, vocês se fingem de respeitáveis enquanto traem suas respeitáveis esposas com respeitáveis prostitutas e trapaceiam seus respeitáveis melhores amigos. E depois ainda vêm acompanhar seus respeitáveis filhos - bastardos ou não, quem sabe? - ao circo, como respeitáveis pais de família. E as mulheres? Respeitáveis donas de casa enquanto fazem visitas noturnas ao respeitável vizinho e mentem para o respeitável marido, dizendo “fui só tomar um ar fresco” ou “fui só comprar pão”. Sejamos claros, respeitável público é o cacete. Decadente talvez seja um termo melhor.


Bom, devo explicar algumas regras aqui. Essa arma, como vocês puderam perceber, não é de brinquedo. Dela saem balas de verdade, e não um simples papelzinho escrito “bang”, como esse palhaço idiota aí pensou. Logo, quem se mexer, vai morrer. E também não vai ser engraçado, respeitável público, não mesmo. Quem falar, também vai morrer. Quem gritar, também. Quem fizer qualquer coisa que eu não gostar, adivinha? Também vai morrer. Então, eu – opinião pessoal – acho melhor ninguém fazer nada. Todo mundo vai ficar bem quietinho e vai prestar bastante atenção ao meu último espetáculo.


Acho que já dei início à apresentação dessa noite. E vocês não podem negar que foi bem surpreendente, afinal, quando vocês iriam esperar vir ao circo para assistir o mais novo palhaço da respeitável Companhia de Circo Brasil ser assassinado na frente de todo mundo? Até das respeitáveis criancinhas inocentes! Mas, criancinhas, eu juro, a culpa não foi minha. A culpa foi do respeitável dono dessa respeitável companhia. E por que? Porque ele disse que eu estava me transformando em um velho gagá, vê se pode? Mas eu já dei um castigo pra ele, criancinhas, podem ficar tranqüilas. É segredo, mas ele está pendurado numa corda lá fora. Garanto que ele não achou isso nada engraçado...


E eis que a dupla de palhaços entra no picadeiro essa noite. Ele – é, esse cadáver gordo estirado aqui – ele pensou que eu fosse seu assistente. Mas – segredo também, não contem pra ninguém, hein, criancinhas! - o assistente também está pendurado numa corda lá fora...e aí, adivinha? Eu entrei no lugar dele! O resto foi fácil, como vocês, respeitável público, puderam perceber. Entre um número e outro, havia essa arma aqui. É, essa mesmo que está na minha mão agora...e o otário pensou que dela saísse só um “bang”...ai, ai, que inocente...


E porque, respeitável público? Porque eu fui despedido! Despedido desse palco em que eu passei a minha vida! Para dar lugar a um jovem palhaço de merda que não sabia nem fazer as criancinhas rirem! Podem dizer criancinhas, vocês estavam se divertindo? Não estavam! Ele era sem graça, chato! Eu fiz um favor pra vocês, viram? Duvido que vocês não tinham vontade de fazê-lo calar a boca! Então...viram como eu amo vocês?


Mas sabe, eu confesso: em tudo isso, uma coisa é mesmo errada. Eu sujei o picadeiro, o palco sagrado de todos os palhaços, de sangue. Sangue. Isso me torna indigno dele! Eu trabalhei nele a vida toda, respeitável público. Nele eu sustentei cinco filhos, uma esposa e três amantes, não ao mesmo tempo, é claro. É, os respeitáveis homens dessa platéia, pensam que sou como vocês? Não! Eu fui fiel a todas elas! Eram fiéis á mim! Menos a minha respeitável esposa, que eu bem sabia que me traía com meu respeitável primo do interior, nosso vizinho. Esse picadeiro era mais que trabalho, era paixão. E agora nem ao menos posso voltar para ele, e tudo por culpa desses malvados! Mas eu dei a eles um castigo, cumpri minha missão.


O que me resta agora, respeitável público? Resta apontar essa arma para a minha cabeça. Vocês estão gostando do espetáculo? Vejo que sim, estão atentos a tudo, os olhos quase saltando das órbitas! Pois então, me resta apontar essa arma para a minha cabeça e dizer que por trás dessa peruca colorida e desse nariz vermelho existe uma alma não mais pertencente a esse mundo. E disparar.

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