25.9.05

Resposta da Maria ao Desafio VII

Por um Instante
(baseado na resposta da Mônica ao desafio IV, "O Instante".)


Ela enrola um cachinho no dedo. Vou sentir falta disso...

Eu procuro minhas meias. E ela se recusa a olhar para mim.

Nossas despedidas estão cada vez mais difíceis. Acho que isso significa que estamos ficando acostumados um ao outro, que nossas vidas estão ganhando um algo de simbiose. Isso é o que costumam chamar de rotina, e a nossa é o mais dilacerante possível: é a rotina do adeus.

Acho as meias. Creio que ela está ciente disso: parece tentar esconder um olhar quase nostálgico através do espelho. Dou um discreto sorriso de canto, como que para dizer a ela que está tudo bem. Ela se concentra nos cabelos rebeldes: provavelmente não acredita em mim. Tenho a nítida impressão de que ela está certa.

Sento na cama e começo a calçar as meias. Cada movimento que faço me afasta mais e mais dela: logo chegará a hora. Quanto mais me afasto, mais negros ficam os olhos castanhos que, do espelho, parecem me dizer “adeus”.

Céus, ela é linda... E eu não sei quanto tempo me faltará a sua presença.

Ela já não se concentra mais nos cachos. Meus cadarços podem esperar. Vou até ela, ponho as mãos em sua cintura e beijo-lhe o pescoço, na tentativa de manter seu perfume engastado na minha memória. De frente para o espelho, contemplamos nossa imagem um instante, como se esperássemos permanecer juntos na superfície cristalina. O quadro é harmonioso: parecemos indissociáveis...

Devagar, ela se volta para mim. Suas mãos procuram meu pescoço: estou aprisionado, e não desejo um habeas corpus. Um beijo. Mais um entre tantos, e ela ainda consegue me surpreender. Estremeço. Ela zomba. Eu a adoro. Tornamo-nos um amálgama de urgência e sutileza. Estamos fundidos, misturados, destacados do mundo e realmente indissociáveis. O corpo dela toca o meu, ora com ternura, ora com desejo: não sinto mais nada, e nem quero. Quero conservar a sensação deste toque por todos os dias em que durar minha ausência. O toque que eu voltarei para buscar, o suspender do mundo inteiro, o escuro aconchegante dos meus olhos fechados.

Com os lábios relutantes em se apartarem dos dela, abro os olhos. Ela ainda mantém os seus fechados, ocupada em dedicar-se a mim.Isso me conforta e me assusta: eu é que deveria me dedicar a ela.

Enfim, ela abre os olhos e me lembra de que já é tarde. Eu sei, mas não quero ir. Eu a beijo novamente, o beijo sôfrego dos fugitivos.

Vai ficar tudo bem, minha menina. Eu volto logo, logo. Não demora, e eu novamente com você. Eu prometo.

1 Comentários:

Blogger Paty disse:

E o beijo tesudo strikes back! Só que aqui recheado de uma tristeza acridoce (tá, eu me rendi a essa palavrinha). Esse texto dói a dorzinha pontiaguda da saudade.

Melancólica ao extremo, transpirando emoção por todos os poros, trata-se de uma cena intensa belamente retratada. Consegue adicionar intensidade ao texto original, em um diálogo de mão dupla permeado pela firme promessa de retorno feita pelo protagonista.

Grande idéia fazer a contraparte masculina da história, Laurinha! Mérito total ao entrar na cabeça desse rapaz apaixonado e sensível.

11/15/2005 5:00 AM  

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